ReIntegrar: Jovens Negros & Mercado de Trabalho Trans-Pós-Pandemia

Autor: Bruna Ribeiro Data da postagem: 14:21 17/05/2022 Visualizacões: 279
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Série especial ReIntegrar - Régia Mabel da Silva Freitas | Imagem: CEERT

A Chamada Pública “ReIntegrar com equidade de raça e gênero para egressos do sistema carcerário” surgiu com o objetivo de mapear, catalogar e valorizar projetos e estudos que objetivem vida digna para pessoas que cumpriram pena no sistema carcerário por meio do trabalho, a partir da perspectiva de equidade racial e de gênero. 

Realizada pelo CEERT, a iniciativa recebeu  470 inscrições das cinco regiões do Brasil. Foram selecionados três projetos (R$ 30 mil para cada) e cinco estudos (R$ 10 mil para cada), totalizando o investimento de R$140.0000,00 (cento e quarenta mil reais). 

Conversamos com os oito selecionados a respeito de seus estudos e projetos. Publicaremos um depoimento por semana nesta série especial. Confira o segundo relato, de Régia Mabel da Silva Freitas, de Salvador (BA), pós-doutoranda em Educação (USP), doutora em Difusão do Conhecimento (UFBA) e autora do estudo O sistema me marcou, mas não me arrebanha: Jovens Negros, Socioeducação & Mercado de Trabalho Trans-Pós-Pandemia:

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Régia Mabel da Silva Freitas: “O meu afroestudo traz à baila as contribuições das atividades pedagógicas com base na (re)inserção no mercado de trabalho trans e pós-pandemia de jovens negros baianos, que cumprem medida socioeducativa na CASE (Comunidade de Atendimento Socioeducativo), unidade da FUNDAC (Fundação da Criança e do Adolescente), localizada no Beirú, em Salvador, na Bahia, buscando a interface entre teoria (base conceitual) e prática (nuance procedimental).

A ideia surgiu a partir da minha interação em palestras com esses jovens que, em suas narrativas, delatam com veemência a violação de direitos fundamentais desde cedo e a necessidade de abandonar a infância e a juventude cada vez mais cedo para contribuir com as despesas familiares. 

O meu objetivo foi investigar experiências profissionais (cursos, estágios e oficinas) promovendo a inserção desses educandos no mercado de trabalho trans e pós-pandemia. 

Para tal, investiguei o (re)ingresso no mercado de trabalho dessas pessoas em desenvolvimento, que portam os grilhões contemporâneos da escravização e que, desde sempre, já se deparam com ausência da garantia das suas necessidades mais primárias como alimentação, educação, moradia, saúde e trabalho. 

A metodologia utilizada foi pesquisa exploratória-descritiva de natureza qualitativa a partir de revisão bibliográfica negro-referenciada, coleta de depoimentos do ex-diretor João Ferreira e da atual diretora Viviane Rocha da CASE Salvador e análise do relatório da Defensoria Pública do Estado da Bahia.

No meu afroestudo, encruzilhei à categoria social raça (negra) as clivagens identitárias de classe (economicamente desprivilegiada), gênero (homem-cisgênero) e geração (jovem), pois esse é o perfil baiano daqueles que cometem ato infracional, em geral, contra o patrimônio (furto e roubo) e contra a sociedade (tráfico de drogas ilícitas) e, por isso, estão cumprindo medida socioeducativa em meio fechado (CASE Salvador). 

Ademais, os jovens negros são as maiores vítimas de imagens preconceituosas e arquetípicas destiladas perversamente pelos veículos de comunicação de massa que prolatam sentenças condenatórias diuturnamente contra eles no “tribunal do júri midiático” como se fossem magistrados togados.

O ReIntegrar ajudará muito financeiramente no meu trabalho, pois nasci e resido num país onde não se estimula nem se investe em pesquisas. 

Como uma resiliente pesquisadora preta interseccional que se debruça sobre as nossas questões raciais, sou extremamente grata pelo reconhecimento da minha qualidade científica e pela remuneração ofertada. Afinal, considero fazer ciência mais uma estratégia preta de resistência da qual nós, intelectuais que ostentamos na pele o brilho azeviche, não devemos nem podemos abrir mão.

A premiação custeará a publicação desse meu afro-estudo, no livro "Direito Negrorreferenciado II: entre Grilhões Escravagistas e Justiça Racial" (Editora Mente Aberta), do qual sou uma das organizadoras, e a compra de exemplares para doação. Ademais, o prêmio também será utilizado para a realização de minhas afro-pesquisas atuais dentro e fora da Bahia.

Uma vez que, ao sair das senzalas (escravização), ingressamos nas favelas (pauperismo), trasladando meramente o espaço no qual temos explicitamente a subjugação dos nossos corpos e corpus, esse edital é de suma relevância, uma vez que questões raciais devem ser amplamente analisadas, debatidas e investigadas ante as pseudo-políticas públicas vigentes no que tange egressos do sistema carcerário brasileiro. 

Os nossos afro-estudos podem fomentar revisão desse projeto genocida do braço estatal ante a contínua descartabilidade da população preta juvenil supostamente fadada a estar presa ou morta sob essa teoria colonialesca de que somos seres perigosos.

O meu sonho antecede a reintegração de egressos do sistema carcerário. O meu sonho é que o fracasso do sistema carcerário seja decretado celeremente ante o reinado pleno de políticas públicas racializadas de reparação. 

Dessa forma, sem egressos, teríamos cidadãos que desde a mais tenra idade tiveram assegurados os seus direitos civis, políticos e sociais e ingressaram no mercado de trabalho de forma digna, colhendo excelentes frutos da educação de qualidade que lhes foi ofertada. 

Outrossim, devidamente integrados à vida em sociedade, nunca escolheriam cometer atos infracionais na fase juvenil como uma opção para resolver questões racistas seculares da herança quinhentista brasileira.”

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