Estudos mostram que estudantes cotistas reconhecem e valorizam as oportunidades que alcançam
Em 2022, a Lei de Cotas, uma política de ação afirmativa bem-sucedida, pode ser revista por parte do Congresso Nacional. Uma política que vem enfrentando ataques no nosso parlamento, através de projetos que visam extingui-la ou descaracterizá-la.
As ações afirmativas e as políticas de cotas nas instituições de ensino superior são fruto da luta do movimento negro contra o racismo e por justiça no tratamento à população que historicamente foi e é discriminada.
A legislação determina o mínimo de 50% de reserva de vagas para o alunado que cursou o ensino médio em escolas públicas. Metade dessas vagas deve ser reservada a estudantes com renda familiar de até 1,5 salário mínimo per capita, bem como para pessoas pretas, pardas e indígenas, com percentual que varia de acordo com a proporção destas populações em cada unidade federativa.
A partir de 2016, a lei foi alterada para incluir pessoas com deficiência. Os resultados de um importante estudo publicado em 2022, avaliando a política de cotas, são alvissareiros.
O estudo foi coordenado pelo Lepes (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação Superior) da UFRJ e pela Ação Educativa.
O estudo revela um aumento expressivo da participação de ingressantes cotistas entre 2010 e 2019. Hoje são cerca de 30%. Constata que estudantes cotistas evadem menos dos cursos de graduação que os não cotistas. Mostra um crescimento sistemático de matrículas do grupo que combina as características: escolas públicas, de baixa renda, pretos, pardos e indígenas.
Um outro estudo, realizado por Sales Augusto Santos e Matheus Silva Freitas e publicado na Revista Brasileira de História & Ciências Sociais em 2021, mostra que o sistema de cotas não trouxe conflitos raciais violentos nos campi universitários, como previam intelectuais oponentes desse sistema.
A pesquisa que realizaram com 69 universidades federais (74,80% do total), bem como o levantamento documental, constata que em 100% das respostas não se confirma a ocorrência de conflitos raciais violentos em seus campi.
Os autores destacam que o historiador George Reid Andrews (1998) salientava que pessoas brancas de classes média e alta no Brasil sabem que vivem numa sociedade com graves problemas oriundos da discriminação racial contra a população negra. Por isso, sempre temem que negros se vinguem algum dia e antecipam a ocorrência de conflitos raciais.
Enfim, vale destacar algumas das recomendações dos estudos citados, em particular o primeiro: ampliar e qualificar a institucionalização das políticas de ação afirmativa; que as universidades desenvolvam o corte étnico-racial no ensino, pesquisa, extensão e gestão; que realizem programas de formação para coordenadores, docentes e técnicos sobre a Lei de Cotas e sobre educação antirracista; que monitorem o sistema de cotas e façam escuta de toda a comunidade universitária, em particular dos alunos; que seja prorrogada a Lei nº 12.990/2014, que reserva 20% das vagas nos concursos públicos e que as cotas sejam estendidas para a pós-graduação; que a educação antirracista atinja os conteúdos de disciplinas e atividades curriculares dos cursos e que na avaliação das condições de funcionamento das universidades essa questão seja considerada.
Salientam ainda que as cotas devem contemplar a diversificação curricular envolvendo as matrizes afro-brasileiras, africanas e indígenas, entre outras, e que é imprescindível garantir a disponibilidade pública de dados que considerem a dimensão socioeconômica e raça/cor por curso.
Apontam a necessidade de ampliar a noção de permanência nas políticas universitárias envolvendo não só bolsas e auxílios financeiros, mas também acolhimento, escuta ativa, acesso a cursos de línguas estrangeiras, dentre outras.
Os resultados mostram que os estudantes cotistas reconhecem e valorizam as oportunidades que alcançam. Se é assim, todos nós também devemos defender o sistema de cotas.
Fonte: Folha de S. Paulo
Categoria: Política no Brasil