Dia da Consciência Negra: nossos passos vêm de longe e vão além

Autor: Bruna Ribeiro Data da postagem: 08:00 20/11/2021 Visualizacões: 157
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Dia da Consciência Negra: nossos passos vêm de longe e vão além./Imagem: CEERT

Celebramos 20 de novembro vislumbrando novas realidades para as novas gerações. Histórias inspiradoras chegam ao CEERT por meio do programa Prosseguir, que tem o objetivo de desenvolver futuras lideranças negras, apoiando jovens negros e negras de baixa renda para que possam concluir o ensino superior, fazer um curso de inglês e projetar seu futuro profissional.

Ser a primeira pessoa da família a cursar uma faculdade é a realidade da maioria desses jovens. Isso traz uma enorme carga de responsabilidade e expectativas. Dificuldades financeiras e falta de pertencimento são alguns desafios enfrentados pelas e pelos jovens participantes do Programa Prosseguir. Por outro lado, todos e todas vislumbram melhores oportunidades profissionais e mobilidade social como resultados do esforço e dedicação empreendidos para cursar uma faculdade. 

Conhecer a história da luta do povo negro no Brasil, sua contribuição para a cultura e riqueza do nosso país e o entendimento do que é ser jovem negro e negra no Brasil, conteúdo trabalhado na formação extracurricular oferecida pelo Programa Prosseguir, tem sido fundamental para o fortalecimento destes jovens.

Perguntamos a cinco estudantes quais são os desafios para a permanência na faculdade e qual é a inspiração para o futuro. Confira as respostas!

Samanttha Gomes das Neves, 32 anos.

Formada em Relações Públicas, na Faculdade Paulista de Comunicação. Participou do Prosseguir por dois anos e agora é integrante do Prosseguir Trajetórias.

Imagem: Arquivo pessoal

Desafio de permanência na faculdade: Um desafio que enfrentei na universidade foi a falta de representatividade. Tive poucos professores negros e não havia grupos de discussões étnicas e raciais, assim como não havia entendimento sobre as necessidades de uma mulher trans. Demoraram quase quatro semestres para que o meu nome social fosse respeitado por alguns docentes.

Fui a primeira pessoa da minha família a entrar em uma universidade e enfrentei dificuldades em disciplinas técnicas que demandam conhecimento prévio, como programas de edição de texto, imagem, planilhas e apresentações.

O Prosseguir foi minha rede de apoio. Foi onde ganhei maior consciência de classe e raça. Aprendi a amar ainda mais o meu povo preto e encontrei muitas pessoas por quem tenho orgulho e me sinto representada. O Prosseguir trouxe pessoas negras em cargos de liderança para contarem suas histórias de uma forma genuína e sincera. A cada encontro, eu saia do CEERT encantada e encorajada a fazer a diferença no espaço que ocupo.

Inspiração para o futuro - Tenho o desejo de morar no exterior para estudar um segundo idioma e fazer uma pós-graduação voltada à análise de dados. Eu consigo me enxergar uma pessoa muito mais forte e propositiva com as experiências que tive no Prosseguir e na faculdade.

Criei bagagem para transitar em espaços acessados por poucos e fazer a diferença levantando pontos críticos, inspirando, ensinando e aprendendo com a diversidade. Percebi que minha voz tem poder e força. Hoje posso levar minha voz e meu pensamento para todos os lugares que faço parte.

Leandro Silva maia dos Santos, 29 anos

Formado em Engenharia Civil, pela União Metropolitana de Educação e Cultura (UNIME), em Salvador (BA). Participou do Prosseguir por dois anos e agora é integrante do Prosseguir Trajetórias.

Imagem: Arquivo pessoal

Desafio de permanência na faculdade: Existem vários desafios, porém o principal deles é como se manter na faculdade. Não existe um apoio para estudantes pretos e de baixa renda, principalmente se for bolsista em uma universidade privada. Nas universidades públicas ainda existem oportunidades de bolsa, em programas como Bolsa Permanência, PIBID [Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência do Ministério da Educação] e PIBIC [Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], porém o benefício é vetado para bolsistas de universidades privadas.

Em relação à contribuição do Prosseguir na minha permanência, poderia citar que o apoio financeiro me permitiu terminar a faculdade sem passar fome e não precisar andar doze quilômetros por dia para estudar, mas considero a credibilidade que o CEERT depositou em mim ainda mais importante que a bolsa. Foi essencial saber que uma instituição como o CEERT acreditava e acredita no meu potencial, não só como profissional, mas como liderança. Ganhei muito mais força para seguir em frente e pude me reunir quinzenalmente com pessoas incríveis que vivem os mesmos desafios e compartilham das mesmas perspectivas.

Os encontros com meus colegas foram imprescindíveis para meu sucesso profissional e também para que eu não me esquecesse de quem eu sou e de onde eu vim. Este aquilombamento foi essencial para que pudesse desenvolver vários soft skills (habilidades interpessoais), que me permitem hoje ser um profissional diferenciado. 

Inspiração para o futuro - A gente passa muito tempo olhando e se preocupando com o mundo e com a perspectiva do mundo sobre nós e acabamos nos esquecendo de nós mesmos: quem somos? O que queremos? O que buscamos? Em uma das palestras do Prosseguir no primeiro ano, ouvi a seguinte frase: “Cuidar do outro é cuidar de mim, cuidar de mim é cuidar do mundo”.

Assumindo essa perspectiva, a primeira coisa que me inspira é a vontade de proporcionar a mim mesmo uma vida mais confortável, depois garantir uma aposentadoria tranquila para os meus pais e por fim e não menos importante poder retribuir parte de tudo que recebi de bom da minha comunidade, do CEERT e de todos que sempre me apoiaram em toda essa jornada. Quero também conseguir inspirar outros jovens a não desistirem dos seus sonhos e acreditarem que somos a mudança que queremos ver no mundo. 

Ana Carolina Fernandes Santos Araújo, 21 anos.

Cursa Psicologia na Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Participou do Prosseguir durante o ano de 2020.

Imagem: Arquivo pessoal

Desafio de permanência na faculdade - Acredito que os maiores desafios são a dificuldade financeira e ideológica, pois a academia é um ambiente elitista e pensado por pessoas brancas para pessoas brancas. É difícil demais se adequar nesse lugar, sempre fazendo malabarismo para trazer narrativas próximas à nossa vivência e se você for baixa renda fica pior.

O Prosseguir me deu uma renda fixa mensal. Eu consegui ficar mais em paz para focar nos estudos. Também me mostrou que sou capaz de aprender inglês com o oferecimento do curso gratuito. Os encontros eram uma espécie de aquilombamento. Compartilhamos conhecimentos e experiências. Eu me sentia acolhida. Além disso, ganhei meu primeiro notebook e isso facilitou demais a minha vivência na faculdade, pois não precisei mais ficar até 22h na faculdade para usar o computador.

Inspiração para o futuro - Espero conseguir ficar fluente no inglês para fazer intercâmbio e produções acadêmicas abordando demandas da população preta, além de finalmente abrir minha clínica.

Jadson Silva Oliveira de Jesus, 23 anos

Participante da edição de 2020 do Prosseguir. Cursa o 8° semestre de Engenharia no Insper, em São Paulo. A partir de janeiro de 2022, irá participar de um intercâmbio na Pôle Universitaire Leonard de Vinci, em Paris, na França.

Imagem: Arquivo pessoal

Desafio de permanência na faculdade - O acesso à universidade é um desafio e as cotas tentam responder a isso, permitindo que iguais compitam com iguais, mas estar na faculdade impõe alguns desafios ligados à permanência. Acredito que o primeiro seja a questão financeira, ainda mais se você faz um curso integral e precisa estar o dia inteiro na faculdade, sem conseguir conciliar o estudo com o trabalho. A saída no geral é buscar oportunidades extracurriculares, como bolsas e processos de iniciação científica e a docência, monitorias ou aulas particulares - atividades que permitam alguma renda.

O ponto disso é que além de dar conta de uma série de questões ligadas à faculdade, você precisa também achar formas de se manter financeiramente, porque algumas famílias não têm condições de ajudar. Por sorte algumas universidades dão auxílio. Foi o meu caso. Eu não conseguiria vir para São Paulo sem o auxílio moradia e auxílio alimentação do Insper, mas ainda assim tive de ajudar os meus pais, porque antes eu era o mantenedor da minha família. Eu bancava a minha casa com o salário de jovem aprendiz.

Inspiração para o futuro - É um sacrifício temporário que a gente precisa fazer para conseguir dar um salto para a classe média. Infelizmente no Brasil são poucas as pessoas que conseguem ascender socialmente sem cursar ensino superior ou pelo menos um curso técnico. É desafiador passar quatro ou cinco anos sem trabalhar, mas se você conseguir se formar e acessar um bom emprego, a chance de ter ascensão social e quebrar o ciclo de pobreza é significativa. 

O apoio financeiro do Prosseguir me ajudou bastante a ficar mais tranquilo em São Paulo, que é uma cidade muito cara. Além disso, acredito que a rede de contatos que a gente forma é muito legal. Até hoje o grupo é muito efervescente e formei boas amizades, o que fortalece nossa rede. Estar em uma comunidade de pessoas pretas com muito potencial faz toda diferença para enfrentar os desafios da faculdade.

Tenho planos no curto, médio e longo prazo. No curto prazo, é começar a minha carreira em uma empresa grande. Além disso, buscar quebrar o ciclo de pobreza da minha família, ajudando outras pessoas a acessarem oportunidades educacionais e terem a chance de ascenderem para a classe média. No longo prazo, quero voltar para a universidade como professor e dar aulas nos maiores centros de engenharia e negócios do mundo.

Algrin dos Santos David, 23 anos.

Cursa Estudos de Mídia na Universidade Federal Fluminense, Niterói (RJ). Participa atualmente do Prosseguir.

Imagem: Arquivo pessoal

Desafio de permanência na faculdade - Eu acho que o maior desafio é a questão financeira. Eu estudo em outro município, então existem algumas questões relativas ao transporte e à subsistência de maneira geral. Eu cheguei a ficar 5 horas no transporte público para ir e vir da faculdade. Todas as dificuldades atravessam a questão econômica. Acredito que se houvesse apoio por parte do poder público como bolsas, os maiores problemas seriam sanados.

Permanecer na faculdade é uma eterna luta entre a necessidade de trabalhar e contribuir com a família e o objetivo de concluir a graduação. Como jovem adulto, aumenta a pressão para arrumar um emprego junto à vida acadêmica.

Além da bolsa oferecida pelo Prosseguir ser uma resposta direta às barreiras impostas ao jovem negro, o programa contribui muito ao criar uma rede de afeto e de suporte. As aulas de inglês também são facilitadoras para a inserção no mercado de trabalho e para a vida de maneira geral.

Inspiração para o futuro - Eu realmente quero me tornar um realizador audiovisual. Com o contexto de pandemia e incertezas, os encontros do Prosseguir têm sido, sem dúvida, momentos de muito crescimento profissional e formativo de modo geral. Eu me sinto sortudo por essas pessoas do Programa – alunes, professores, coordenadores e convidades em geral – terem surgido nesse momento em minha vida.

 

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